Malta Inspirada: Como o Fred foi jogar futebol para os EUA depois de duas operações ao joelho

Editor Inspiring Future
9 maio 2019

Fred, antes de começarmos a falar, há uma pergunta que se impõe. Tu tiveste uma lesão bastante grave, recuperaste, voltaste a correr, a jogar, a candidatar-te e foste aceite. És mesmo muito bom ou o nível é baixo? 

“Eu acho que tenho um bom nível; mas o nível do campeonato universitário nos EUA é mais baixo do que a maioria do campeonato nacional em Portugal. Portanto espero ir para lá e conseguir destacar-me.” Estas eram as palavras do Fred quando visitou o nosso escritório, para uma conversa sobre como conseguiu ir jogar futebol e tirar mestrado numa Universidade norte-americana.

“É o sonho…”, diz-nos. “Vou com sonho e com objetivo, que são coisas diferentes. Com objetivo de tirar um MBA, na Lincoln Memorial University, do Tennessee, e ficar assegurada a possibilidade de ter uma carreira profissional boa; e com um sonho, que é tornar-me jogador de futebol profissional. Sei que continua a ser difícil, mas se calhar por lá o nível ser mais baixo e eles apostarem muito em quem sai das universidades tenho uma melhor possibilidade de o conseguir.”

Ainda assim, o Fred, que se licenciou na Faculdade de Motricidade Humana, tem um plano B: “Caso isso não aconteça, é uma situação win-win porque fico com o mestrado, e se tiver possibilidades fico lá a trabalhar.”

Com 23 anos, a história do Fred tem várias operações e dor à mistura. Também frustração de querer jogar e não poder. “Cheguei a fazer aquela pergunta do ‘Porquê eu?’ É uma pergunta estúpida mas…” Não a conseguiu evitar. Pudera: fez um treino de captação na Next Level (empresa que coloca os jovens a jogar futebol nos EUA). Pagou-a, como todos e foi aceite, como alguns. Depois, foi filmado durante vários treinos e reuniu os seus melhores momentos para enviar para treinadores interessados do outro lado do Atlântico. “Fiz um treino em maio, outro junho e outro setembro, até que me lesionei. Estava a jogar futsal, rodei a perna mas o pé ficou no mesmo sitio, portanto o joelho saiu e voltou a entrar.”

 

Diagnósticos errados, operações e 701 dias sem jogar

Aí foi o começo de uma etapa complicada: “Inicialmente achavam que era ligamento lateral, portanto não fiz logo ressonância. Com o ligamento lateral não é preciso fazer operação a não ser que seja rotura completa. Depois fui a outro médico e afinal era menisco (parte interior do joelho). Aí marquei operação para dezembro. Com o menisco a recuperação é de um mês, uma semana de muletas”

Acontece que depois de andar apoiado por canadianas durante um mês e meio e de ter tirado liquido do joelho três vezes, o Fred ainda não conseguia correr; e nem os dois meses e meio de fisioterapia ajudaram. “Tive de trabalhar no verão porque não tinha dinheiro para ser operado outra vez. Mudei de fisioterapeuta e de médico.” Nesta altura o Fred já tinha recebido uma proposta para ir jogar para os EUA mas como não conseguia correr teve de a descartar.

Com o novo médico há uma nova suspeita: “Desconfiou de que há outra coisa - o ligamento cruzado interior. E na verdade havia uma falha. Tive de ser operado outra vez. Foram depois seis meses de recuperação. Em julho do ano passado tive alta. Foram, nunca mais me esqueço, 701 dias sem jogar futebol.

Custou-te mais esta lesão porque tinhas a proposta para ir jogar a bola? “Sim, sem dúvida. Fui-me muito abaixo, mesmo nas notas. Agora quero provar a mim mesmo, não é a ninguém, que consigo jogar futebol a um bom nível.” Durante a sua recuperação, o Frederico filmou-se durante os treinos de reabilitação e foi colocando nas redes sociais. “A ideia foi do meu fisioterapeuta e assim fui me motivando com o feedback dos meus amigos.”

Com a impossibilidade de jogar, o atleta em recuperação abandonou então a Next Level devido à lesão mas juntou-se, quando já estava apto, à Sports4me. “Falei com o João Pedro Carvalho, que já me conhecia e que abriu esta nova organização. Eles aceitaram-me porque já me conheciam e o resto funciona da mesma forma”

Com o novo vídeo feito, o Fred averiguou os interesses comuns entre os cursos da faculdade e a posição do jogador. “Quando já está decidido qual é a combinação ideal, começa-se a falar de valores, sendo que as bolsas são comparticipadas num mínimo de 50%.”

Saber de antemão o que lhe espera

Antes de ir, o Fred já tinha reunido alguma informação fundamental: “Há treinos bi-diários. O primeiro das 8 da manhã às nove e meia, depois almoçamos juntos e temos outro treino. E ainda há meia hora de treino para melhorar um aspeto mais especifico. A pré-época começou dia 8 de agosto e a primeira semana é de testes físicos; é puxado…alguns vomitam nessa altura.”

“A época é só de setembro a dezembro, porque neva em vários sítios. Os planteis são grandes (29 jogadores na equipa deles) porque são 15 jogos em dois meses, um jogo a cada quatro dias.Depois se passarmos à próxima fase são mais. Treinamos quando não há jogo. Há sempre treino de futebol e depois, eventualmente, pode haver trabalho de ginásio, pelo menos no meu caso é assim. No segundo semestre não há competições oficiais, jogamos só amigáveis. O primeiro semestre começou a 14 de agosto e acaba dia 8 de dezembro. Já tenho bilhete de volta para cá para dia 9.”

Quem organiza a competição é NCAA e existem 3 divisões. “Mas não se sobe nem desce. Estas numa ou noutra consoante os requisitos (orçamento, numero de alunos, capacidade do estádio) preenchidos pela tua universidade.” As operações tendem a ser megalómanas, um pouco à semelhança dos hábitos norte-americanos. Exemplo disso é o facto de alguns desses jogos chegarem a transmitidos pela televisão. “Vou jogar na segunda divisão mas já sei que para o ano a minha universidade vai para a divison 1 – ou seja, jogo um ano numa e outro noutra.”

Quanto ao jogo jogado, o Fred prefere atuar a médio defensivo mas depois de algumas conversa via Skype com o mister já sabe que vai jogar mais subido no terreno. “o meu coach disse que queria que jogasse mais à frente. até porque tenho o capitão a medio defensivo e duvido de que lhe tire o lugar”, diz, entre risos.

O conhecimento de terreno à distância

Quais foram as tuas maiores preocupações no que diz respeito à vida naquela região dos EUA? “O tempo”, diz rapidamente. “não gosto de frio e nunca lidei muito bem com isso, até porque morei no algarve 11 ou 12 anos. Já sei que no Tennessee neva… não é muito, mas neva; acho que isso vai ser um problema.”

E ir de um país para o outro, teres de viver num sítio completamente diferente, noutra casa? “Já mudei de casa sete vezes e só tenho 23 anos, portanto essa parte.... mas, sim, é um desafio completamente diferente. Já sei que vou viver dentro do campus. Pode-se escolher entre dormir no dormitório, onde a casa de banho é comum, ou viver num aparamento, que é mais caro mas consoante a bolsa que tenhas varia. “Eu optei por um apartamento de 6 quartos e 3 casas de banho. Vou morar com um holandês, inglês, alemão. Sou o único português.”

Uma das maiores preocupações do Fred eram… os lençóis. Parece estranho mas a verdade é que são coisas que tomamos como garantidas em nossa casa, mas para onde o Fred era mesmo um assunto a tratar: “a casa não tem nada… lençóis, talhares… o que me sugeriram foi encomendar para chegar ao mesmo tempo do que eu.”

As férias, viagens e trabalho

“Em Portugal acabamos as aulas e temos férias que na verdade não o são porque estás a preparar-te para os exames. Lá os exames são de 4 a 8 de dezembro. Em vez de serem em janeiro, como em Portugal. Já o segundo semestre acaba na segunda semana de maio. Assim, tenho mesmo 3 meses de férias.” O que permite ao Fred viajar e conhecer outras cidades.

Ainda assim, e porque é importante aliviar os custos do processo, o Frederico até pensou em fazer uns trocos mas teve uma resposta definitiva: “Tinha a ideia de trabalhar lá, mas o meu treinador não deixou mesmo. Disse-me: ‘tu vens para aqui para jogar futebol e para estar com a equipa, não quero que te distraias nem te canses’; mas no segundo semestre vou procurar algum trabalho; mesmo dentro do campus há algumas oportunidades em cafés e assim… mas ainda não tenho nada definido.”